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IIegal, e daí?: música alta, ambulantes e passageiros deitados nos bancos fazem parte da rotina de quem usa os trens no Rio
2024-12-06 HaiPress
Homem dorme sobre os bancos do vagão,sem se incomodar com a goteira que caía do teto e molhava o chão: o trem enguiçou na estação de Belford Roxo e foi substituído — Foto: Carmélio Dias / Agência O Globo
RESUMO
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Desafios e medidas na SuperVia do Rio
Usuários enfrentam desafios nos trens do Rio,com problemas como atrasos e falta de acessibilidade. Ambulantes lotam os vagões,enquanto vandalismo e furtos são comuns. A operadora SuperVia lida com reclamações e monitora a segurança. Medidas educativas visam melhorar a experiência dos passageiros.O Irineu é a iniciativa do GLOBO para oferecer aplicações de inteligência artificial aos leitores. Toda a produção de conteúdo com o uso do Irineu é supervisionada por jornalistas.
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No mundo ideal,os trens são,de longe,a melhor opção para o transporte em grandes cidades. Rápidos,evitam engarrafamentos,podem levar muitas pessoas por viagem com relativo conforto e são ambientalmente mais sustentáveis. No Rio,há tempos a locomoção ferroviária é mais conhecida como fonte de dor de cabeça para os passageiros. Usuários atribuem as deficiências do sistema à operadora,mas outros tantos contratempos poderiam ser evitados com a conscientização de quem usa o serviço diariamente. Ninguém discorda,no entanto,que,a bordo ou nas plataformas,problemas não faltam.
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De acordo com a SuperVia,em média,306 mil passageiros foram transportados por dia até junho deste ano — muitos desembarcam insatisfeitos. Só na ouvidoria da Agetransp,agência reguladora dos transportes sob concessão,foram registradas,até setembro,756 reclamações contra a concessionária — o número,que envolve problemas como atrasos,intervalos de viagem irregulares e falta de acessibilidade,já supera os totais do ano passado (620) e de 2022 (565).
Na manhã de anteontem,o trem que deveria partir da estação de Belford Roxo às 9h36 apresentou “uma avaria na porta”,segundo a SuperVia,e foi substituído por outro,mais moderno,que saiu às 9h52. A troca,informa a concessionária,faz parte dos “protocolos operacionais” para “garantir a segurança dos usuários”. Durante a espera,chamavam a atenção no vagão lâmpadas fluorescentes faltando — uma delas estava solta no chão —,água pingando sobre os bancos e lixo plástico debaixo dos assentos. Deitado,ocupando espaço suficiente para três pessoas,um passageiro,abraçado a uma garrafa,ignorava as gotas que caíam do teto.
Vaivém de ambulantes
Quando o trem deixou a estação,os olhares se voltaram para cenas conhecidas de quem usa o serviço todo dia: ambulantes em vaivém frenético oferecendo toda sorte de produtos: biscoitos,doces,adaptadores para tomadas,enfeites luminosos para o Natal a R$ 20 cada,facas (afiadas,garantia o vendedor) e até remédios. Eram anunciados,a preços módicos,anti-inflamatório,analgésico,pomada cicatrizante e xarope. A certa altura,um dos mascates pisou no pé de um passageiro,mas logo pediu desculpas,emprestando alguma civilidade ao momento.
Em outros pontos do trem,o tão prezado “silêncio da viagem” era quebrado não pelos vendedores,mas por aparelhos celulares. Sem fone e com o volume nas alturas para superar o barulho do deslocamento do trem,havia gente ouvindo música,jogando,assistindo a vídeos... tudo ao mesmo tempo. Ninguém reclama. Há um certo “código de ética” não escrito que regula a convivência nos vagões. E isso vale para o bem também. Quem usa o transporte com frequência afirma que ceder o lugar para idosos e gestantes,por exemplo,é regra de ouro nos ramais da Central.
A fidalguia dos passageiros,faltou à concessionária na hora de dimensionar a operação. Em estações como Vila Rosali e Pavuna,a altura e o vão,respectivamente,separando o trem da plataforma,são obstáculos que impedem o acesso de cadeirantes e complicam a vida dos mais idosos.
Sem coleira
No meio do caminho,eis que entra um passageiro trazendo consigo sua cadela. Sem coleira. Ela late,brinca com o dono e rapidamente vira uma atração do pedaço. A maioria sorri e parece gostar da presença canina,mas há quem demonstre certa apreensão.
E aqui termina a parte fofa ou pitoresca do trajeto. Há trechos da ferrovia em que a barra pesa de verdade. Quando o trem para na estação Jacarezinho é possível ver do lado de fora parte considerável do terreno tomada por barracas improvisadas.
O mesmo acontece em outro ramal. Na última terça-feira,uma equipe do GLOBO embarcou às 13h no trem que sai de Santa Cruz,na Zona Oeste,em direção à estação Central do Brasil. A viagem,que dura em média duas horas,é acompanhada por muito barulho e aperto. Os onipresentes ambulantes entram e saem anunciando suas mercadorias aos berros. Apesar dos vagões lotados,se deslocam com isopores recheados de bebidas abrindo espaço entre os passageiros e disputando cada centímetro com os concorrentes.
Ao passar pelas estações Senador Camará e Mocidade/Padre Miguel,é possível ver mais barracas instaladas ao longo da linha. São pelo menos dez. Em Senador Camará,dois rapazes sentados na janela sem vidro do primeiro vagão contaram que esses pontos são “bocas de fumo”. Pouco antes de descer,enquanto o trem ainda estava em movimento,um deles chegou a colocar seu corpo para fora por uma das portas quebradas,ficar de pé,e simular uma espécie de “surfe ferroviário”,prática perigosa que já custou a vida de muita gente.
— Tira essa câmera da janela,moça. É capaz deles tacarem pedra na gente ou até atirarem na nossa direção — disse um dos passageiros à equipe pouco antes de saltar.
A atitude dos homens que viajavam pendurados na janela ou com o corpo para fora é classificada pela SuperVia como comportamento “extremamente perigoso” que “coloca em risco a integridade dos envolvidos e a segurança operacional do trem”. A empresa afirma promover campanhas de conscientização a respeito e trabalhar “junto aos agentes de segurança para monitorar e coibir essas ações”.
Pelo buraco
A tensão se repetiu quando o trem chegava em Mocidade/Padre Miguel,onde barracas também estavam à vista.
— Aqui é melhor vocês evitarem tirar foto. Por qualquer coisa eles se revoltam — avisou outro passageiro,que logo saltou.
Ainda nesta estação,pessoas entravam sem pagar,passando por uma abertura no muro da linha do trem. Tudo é feito tranquilamente,não se nota preocupação com a fiscalização. As pessoas entram pelo “buraco” como chamam o acesso,e caminham até a plataforma. Para quem viaja com frequência de trem,pagando R$ 7,10 pela passagem cheia,presenciar um calote não é incomum.
Não importa o ramal,é comum também encontrar vidros quebrados ou riscados e os assentos arrancados,entre outros sinais de vandalismo. O furto frequente de cabos e fios é outro transtorno. Ao longo dos trilhos há ainda muito lixo atirado pelas janelas.
A SuperVia — que assinou acordo com o governo do estado para deixar a operação dos trens no ano que vem — informa que recolhe,por mês,“52 vagões-gôndola (o equivalente a 1.200m³) de resíduos ao longo dos 270 quilômetros de malha ferroviária”,que “a presença de barracas e lixo é monitorada,e as autoridades competentes são acionadas quando necessário” para garantir “a segurança operacional e a limpeza da linha”.
Sobre janelas e assentos vandalizados,a concessionária afirma que entre janeiro e outubro deste ano registrou 5.016 casos de visores de porta e 1.093 assentos danificados. A empresa diz ainda que tem instalado “kits antivandalismo” para proteger as portas e que realiza campanhas educativas.
*Estagiária sob supervisão de Cláudia Meneses.
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