Religiosidade: a fé que move os sambas-enredo para 2025

2024-10-21     HaiPress

Finais de samba enredo para o carnaval 2025. Sangueiro: Xande de Pilares é um dos autores do samba campeão — Foto: Divulgação / Felipe Araújo

RESUMO

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GERADO EM: 21/10/2024 - 04:30

Sambas-enredo de 2025: Espiritualidade Afro-Brasileira

Religiosidade e ancestralidade marcam sambas-enredo de 2025 com termos africanos. Enredos abordam temas como entidades afro-indígenas,orixás e tradições religiosas. Palavras como "fé","macumba" e "ebó" ressaltam a conexão espiritual. Compositores buscam simplicidade e compreensão em letras para não afastar o público.

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Com enredos marcados pela ancestralidade e pela religiosidade,a palavra “fé” acaba se destacando nos sambas-enredo que as escolas do Grupo Especial levarão para a Sapucaí em 2025. O vocábulo aparece nas letras dos hinos escolhidos pela Unidos de Padre Miguel,Salgueiro,Unidos da Tijuca,Grande Rio,Portela e Paraíso do Tuiuti,ou seja,metade das 12 agremiações. Pela mesma razão,a maioria dos versos também faz bastante uso de termos de origem africana.

Finais de samba enredo para o carnaval 2025. Na foto,Beija-Flor,com direito a sósia do Laíla,homenageado do próximo carnaval,em meio aos compositores — Foto: Divulgação / Eduardo Hollanda

Sidnei França,carnavalesco que desenvolverá o enredo da Mangueira “À Flor da Terra – No Rio da Negritude Entre Dores e Paixões”,sobre a herança do povo bantu,diz que a sinopse muitas vezes já dá uma pista de conceitos que serão abordados no desfile,daí o uso de palavras e termos comuns a várias escolas.

— O Brasil,cada vez mais,está resgatando sua identidade mais íntima,que é a cultura,um entrecruzamento de várias origens. Acho bem complicado quando alguém acompanha um desfile e não consegue dimensionar sua potência. São tradições que não estão no seu cotidiano,isso significa ensinamento,tradição,ancestralidade e fundamentos — afirma.

A atual campeã,Viradouro,que falará de Malunguinho,entidade afro-indígena que se manifesta como Caboclo,Mestre e Exu,traz no samba expressões como “alujá ligeiro”,em referência ao toque de Xangô para Malunguinho,e “jurema”,planta sagrada.

A Imperatriz contará na Sapucaí a ida de Oxalá ao reino de Oyó,na África,onde é hoje a Nigéria,para visitar Xangô. A letra do samba-enredo traz termos como “itan” (lenda),mas também menciona palavras do universo religioso,como “ebó”,que nada mais é que um ritual ou oferenda.

Nesse universo,as palavras “macumba” e “macumbeiro” também acabam aparecendo em diferentes sambas,como reafirmação de religiosidade. Ambas podem ser encontradas nas letras dos hinos da Unidos de Padre Miguel — que contará a história de Iyá Nassô,ialorixá fundadora da Casa Branca do Engenho Velho,na Bahia,primeiro terreiro de candomblé do Brasil — e do Salgueiro,“de corpo fechado”,conforme menciona o enredo da vermelho e branco tijucana.

— O samba do Salgueiro vem dando importância à coisa de se cuidar espiritualmente,de tomar banho de erva,acender vela para o anjo da guarda,saudar o preto velho,as almas,os orixás e o povo da rua. É a forma também de prestigiar o povo macumbeiro — aponta Xande de Pilares,um dos compositores do samba salgueirense.

As guias de Laíla

Na Beija-Flor,que tem como enredo o carnavalesco Laíla,morto em 2021,o samba destaca a religiosidade do homenageado. “Da casa de Ogum,Xangô me guia”,canta o refrão. A imagem de Laíla ficou marcada pelo uso das múltiplas guias que o acompanhava nos desfiles e nas apurações.

A Unidos da Tijuca,que tem a cantora Anitta no seu time de compositores,desfilará com o enredo sobre o orixá Logun Edé,filho de Oxum e Oxóssi,cultuado nos candomblés de origem yorubá. É ele,inclusive,que rege a “poderosa”. A letra é repleta de referências à religiosidade. “De tudo que aprendi,o todo que reuni/Fez imbatível a força do meu axé”,diz um trecho.

A religiosidade também não poderia ser esquecida no samba da Portela,que homenageará Milton Nascimento. “Vou partir em procissão na fé,que faz do artista entidade”,diz a letra do hino composto pela parceria encabeçada por Samir Trindade.

A Paraíso do Tuiuti,que levará para a Avenida a história da africana Xica Manicongo,primeira travesti do Brasil,desfilará com o samba encomendado à parceria que tem Cláudio Russo e Gustavo Clarão. Para Russo,sem a pressão da disputa o compositor pode contar apenas com sua inspiração,sem precisar se valer de “refrões possantes e fortes” para não correr risco de ser eliminado.

Na Grande Rio que,de forma inédita,realizou disputas de samba em Duque de Caxias e no Pará,estado que homenageia no enredo,levará para a Sapucaí um mergulho nas águas amazônicas,com a presença do carimbó,dança típica paraense,e os encantamentos do tambor de mina,denominação religiosa que cultua voduns,orixás e encantados. A parceria campeã é paraense,com o Mestre Damasceno — que concorreu pela primeira vez no Rio — entre os compositores.

Tem fantasmas e sonhos

Já a Vila Isabel,uma das poucas que não abordam ancestralidade nem religião,resolveu carnavalizar assombrações e seres fantásticos de outro mundo,com o enredo “Quanto mais eu rezo,mais assombração me aparece”. A escola traz uma das letras mais simples e de fácil compreensão. O mesmo acontece com a da Mocidade,cujo enredo “Voltando para o futuro não há limites para sonhar” é uma espécie de manifesto pelo futuro da humanidade.

O experiente compositor André Diniz diz ser comum uso de dialetos nos sambas que tratam de temas africanos. Mas adverte que palavras rebuscadas e de difícil compreensão,mesmo da língua portuguesa,podem ser uma armadilha.

— Se,por um lado,nos aproxima da nossa cultura,por outro é ruim,pois com tantas palavras incompreensíveis pode afastar as pessoas — conclui.

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