A atitude da sociedade com relação à infância e celular está mudando. E para melhor

2024-09-12     HaiPress

Crianças jogam bola em escola no Recreio dos Bandeirantes — Foto: Leo Martins

RESUMO

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GERADO EM: 12/09/2024 - 04:30

Proibição de celulares nas escolas traz benefícios para crianças

A atitude da sociedade em relação ao uso de celulares por crianças está mudando,com evidências de benefícios ao proibir os dispositivos nas escolas. Resultados positivos incluem melhora no desempenho acadêmico,redução do bullying e aumento da interação social. A proibição já é critério de escolha para muitos pais na matrícula,com relatos de maior foco,concentração e interação entre os alunos,além de redução da ansiedade. Escolas pioneiras já adotaram a medida,observando aumento na demanda e reconhecimento do valor do recreio como espaço fundamental para o desenvolvimento infantil.

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Duas reportagens na mídia essa semana dão conta da repercussão e dos resultados de uma proposta que venho fazendo há muito tempo,a mesma que Jonathan Haidt,autor do livro de maior sucesso do ano nos EUA e segundo maior pré-lançamento da Companhia das Letras por aqui: o celular zero na escola (na sala de aula e no recreio também). E ambas mostram que temos razão.

Quem se opõe à ideia afirma que “não podemos afastar as crianças da tecnologia”. E eles têm razão,claro que não podemos. A tecnologia digital e a internet são a principal plataforma da vida moderna e se tornaram indispensáveis a indivíduos e sociedade. Mas podemos,sim,afastar as crianças e adolescentes do celular pessoal e seus aplicativos tóxicos e viciantes.

Aliás,a confirmação dessa estratégia de proteção à infância,ao aprendizado e ao precioso brincar já vem sendo feita por vários artigos científicos. Um dos mais importantes é de fevereiro desse ano. Uma pesquisa da Noruega,envolvendo 161.371 estudantes em 477 escolas de ensino médio,revelou os seguintes efeitos da proibição de celulares:

redução significativa (60%) nas visitas médicas relacionadas a sintomas psicológicos e doenças entre meninas;diminuição no bullying em ambos os gêneros;melhora nas notas e na frequência escolar das meninas;observação de efeitos mais marcantes entre meninas de menor renda.

As matérias no Brasil,publicadas pela Folha de São Paulo,dão conta de depoimentos de alunos,professores,gestores e pais sobre o tema. E como eu previa: todos estão felizes. Sim,mesmo os estudantes,que após um compreensível e previsível período de abstinência,reclamação e atos de resistência,se habituam e então começam a gostar. Gostam porque voltam a brincar,a conversar entre si,a falar de outras coisas senão bobagens inúteis e fofocas de celebridades.

Um estudante da rede municipal do Rio de Janeiro – que baniu,por lei,os celulares nas escolas da prefeitura no início deste ano,tanto nas aulas quanto nos intervalos – disse que no início foi ruim,mas que agora gosta da medida. "Antes de ser proibido,a gente sempre ficava jogando um contra o outro,na aula e no recreio,conversando na rede social,vendo vídeos,apostando em bets e no tigrinho.” Agora consegue prestar a atenção nas aulas e suas notas melhoraram,deram um salto surpreendente. De uma nota perto da reprovação,em poucos meses atingiu o conceito logo abaixo da nota máxima.

Coordenadora da escola do estudante (Martin Luther King),Thaís Trindade conta: "Temos vários alunos que são inteligentes,mas não conseguiam ter um bom desempenho por causa do celular". E conclui: "Sem o aparelho,eles começaram a entender as matérias,tirar notas melhores,passaram a ser elogiados pelos professores e a se sentir estimulados".

Até mesmo o uso fora da escola vem diminuindo: um efeito colateral maravilhoso,que eu não esperava. Os jovens dizem se sentir "menos viciados" no celular depois da proibição na escola. "Fui me acostumando e decidi mudar outras coisas na minha vida para ser mais saudável",diz uma aluna. "Eu era sedentária e passei a fazer esporte todos os dias,o que me ajuda também com a ansiedade",completa.

E os depoimentos prosseguem: “Passamos a conversar sobre situações da escola,a falar sobre nós mesmos". "Agora a gente toma sol deitada no banco,enquanto conversa. Nunca tínhamos feito isso antes." “Conforme o tempo foi passando,as relações sociais mudaram bastante,a gente conversa muito mais.” "O aumento da produtividade e do foco é notável."

A outra matéria,do mesmo jornal,mostra que a proibição do uso do celular passou a ser um critério na escolha da escola para muitos pais,que já percebem o resultado positivo em outras famílias.

O banimento do uso dos smartphones no ambiente escolar cresce no Brasil (já chega a 34% das escolas,segundo a pesquisa TIC Educação,publicada recentemente) e em outros países. Segundo a reportagem citada,há muitos pais que “não negam a importância da tecnologia na educação,mas entendem que seus benefícios passam longe de intervalos com crianças e jovens com a cabeça curvada e os olhos mergulhados em uma tela”.

A matéria prossegue: “Os resultados começam a aparecer ao longo dos meses. Em escolas brasileiras e de outros países,os relatos são de que os alunos ficam mais focados,concentrados e,consequentemente,suas notas sobem; a ansiedade diminui,e aumenta a interação entre eles,além da disposição para ler livros,brincar e praticar esportes”.

Que cenário poderia ser melhor? A coragem das escolas privadas pioneiras,e da Rede Municipal do Rio,a primeira órgão público a assumir essa medida,foram decisivas para começar a girar o ciclo virtuoso.

“A fase de matrículas está começando,e essas escolas (particulares) afirmam que a procura tem sido animadora. Uma delas,de São Paulo,que adotou a medida no início de 2024,conta que bateu recorde de transferências no meio do ano e,para 2025,está com uma demanda 20% superior à que registrou nesse mesmo período no ano passado”,continua o texto da matéria.

E a melhor parte: “Quando vão conhecer essas escolas,os pais se impressionam especialmente com o recreio,que ganha um ar "retrô",fica mais parecido com o do tempo deles”. É exatamente o que eu dizia ser mais importante: entender que o recreio é precioso,que é o espaço público da criança. É um território da brincadeira (um dos últimos que resta à infância),onde são adquiridas habilidades fundamentais para a vida,onde exerce o relacionamento com os outros,o movimento.

Pense nisso nesse momento em que começa a fase de matrículas para escolas no Brasil inteiro. Na minha opinião,é um dos critérios mais importantes.

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